Sabemos o quanto, atualmente, é difícil encontrar um consenso positivo sobre alguma figura histórica ou celebridade. É muito fácil macular a imagem de alguém, especialmente quando essa pessoa decide assumir as rédeas de uma área tão controversa quanto a energia nuclear.
Bem, confesso que, até pouco menos de dois meses, sequer imaginava quem era esse tal "Rickover". O pai da Marinha Nuclear? Lembramo-nos de gente como Oppenheimer e Wernher von Braun, talvez porque, apesar da sua contribuição para um derradeiro saldo "positivo" para a humanidade, recorreram ao uso da violência e da destruição para deixar o seu nome marcado na História.
Mas Hyman G. Rickover é diferente... seus planos alimentavam um ideal pacífico e nobre: o uso da energia nuclear para fortalecer o desenvolvimento industrial da sua própria nação e, possivelmente, do mundo inteiro. Quando ele percebe que a sua criação passa a alimentar ideais maquiavélicos, fica claramente desapontado com os rumos que a humanidade optou por seguir.
Um judeu - mais uma vez, um judeu brilhante - perseguido, descartado, desprezado e esnobado por uma Marinha antissemita e preconceituosa, que deu a volta por cima, com um esforço árduo, bravura e um código de honra absolutamente impecável, além de um brilhantismo na Engenharia que tornou-um, segundo muitos, num dos maiores especialistas em máquinas e equipamentos da história da Humanidade. Um homem que não temia desafiar os seus superiores nem, muito menos, ensinar aos seus subordinados o que é a responsabilidade coletiva, ainda que na base da marra e da opressão moral. Será mesmo que ainda existe alguém assim, agora?
Nessa jornada de duas horas, passei a entender claramente por que o denunciante do incidente de Three Mile Island, a cuja série assisti na semana passada, protestou contra os empreiteiros das usinas nucleares e as autoridades da agência regulatória de energia nuclear americana, mas frisou especificamente que Rickover, este mesmo Rickover, era o seu maior ídolo e inspiração. Quando retorno a este documentário, deixou-me de surpreender, portanto, ver diversos almirantes e oficiais de alta patente, ambientalistas e até um certo ex-presidente muito honrado dos EUA não medirem esforços para expressar a sua mais sincera e profunda deferência e homenagem a esse homem.
Quando paramos para pensar que, em décadas de operação de embarcações e usinas nucleares operadas pela Marinha, nunca houve sequer um acidente, somos compelidos a crer simplesmente que a
mais volátil das forças da Natureza foi mantida sob o controle firme e impecável de, talvez, o mais volátil dos homens.
Viva o almirante Hyman G. Rickover.